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O Instituto DataSenado apresentou nesta terça-feira (3) um estudo sobre os cuidadores de pessoas com deficiência, com doenças raras e idosos. Segundo a pesquisa, a profissão cresceu nos últimos anos. O Brasil tem mais de 34 mil cuidadores de idosos, mas não existem estimativas confiáveis do número de cuidadores de pessoas com doenças raras ou com deficiência, diz o estudo. Os resultados foram debatidos em audiência pública promovida pela Subcomissão Permanente da Pessoa com Deficiência, pela Subcomissão Permanente de Proteção e Defesa da Pessoa Idosa e pela Subcomissão Temporária sobre Doenças Raras, que funcionam no âmbito da Comissão de Assuntos Sociais (CAS).

Entre cuidadores profissionais e cuidadores familiares, foram ouvidas 2,4 mil pessoas por telefone ou grupos focais, em Brasília, Curitiba, Salvador, São Paulo e Manaus, no período de 24 de julho a 1º de agosto deste ano.

O cuidador é uma pessoa que zela pelo bem-estar de outra pessoa que esteja incapaz, por limitação física ou intelectual, de cuidar de si mesma, atendendo a necessidades de higiene pessoal, alimentação e remédios, entre outras.

O estudo revelou que 41% dos brasileiros conhecem alguém que depende da ajuda de um parente ou cuidador para realizar atividades do dia a dia, como comer, tomar banho ou trocar de roupa.

Mais da metade (55%) dos cuidadores que participaram da pesquisa telefônica responderam que se sentem sobrecarregados.

Entre os cuidadores familiares, a atividade tem implicações emocionais, sociais e profissionais. Nesse caso, há uma percepção de “anulação” do indivíduo, já que 79% dos participantes da pesquisa não trabalham, sendo que a maioria (60%) afirmou que gostaria de trabalhar e 80% disseram que não trabalhar prejudica a renda familiar.

Por outro lado, os cuidadores profissionais se queixaram de agravos físicos e emocionais relacionados à jornada excessiva.

De modo geral, a maior parte dos cuidadores reclamou da falta de cursos técnicos e treinamento, reconhecimento, valorização e regulamentação da profissão.

— Esses resultados fazem parte de uma série de estudos que terá continuidade em 2020 e subsidiará o debate de uma proposta de Política Nacional de Cuidado — explicou Laura Efigênia do Nascimento, coordenadora do DataSenado.

Cuidando de quem cuida
A experiência de Jéssica Alves Guedes, participante da audiência pública, reflete bem os resultados da pesquisa. Uma das suas duas filhas tem uma doença rara e é deficiente. Como cuidadora familiar, enfrentou a falta de informação, de apoio, e lutou contra a negligência e o preconceito na busca por um diagnóstico. A sua trajetória sensibilizou profissionais e outras pessoas que, também nas redes sociais, se uniram na criação em Brasília do grupo terapêutico “Cuidando de quem cuida”, para ajudar outros cuidadores.

Jessica lembra que nem toda família tem o suporte do homecare (atendimento em casa), muitas mães são abandonadas pelos maridos, incompreendidas pelos médicos, obrigadas a deixar de trabalhar e ainda se dividem entre o leito da criança doente e a atenção aos outros filhos.

— Sabemos que nós temos um longo trabalho pela frente. E a verdade é que a gente precisava que esse apoio fosse oferecido nos serviços de saúde, no Distrito Federal. Aqueles lugares que recebem os pacientes com doenças crônicas e raras deveriam ter esse suporte para a família igual ao que a gente oferece — disse.

Já para o cuidador profissional Francisco Sousa de Moraes, com 20 anos dedicados ao mesmo paciente — a quem acompanha até mesmo no local de trabalho — a regulamentação da profissão é fundamental.

— Para você ter um direito, você ter um salário digno, de um amparo. Muitas das vezes, algumas pessoas não têm condição e ganham muito pouco. E até para ajudar a família — observou.

A própria senadora Mara Gabrilli (PSDB-SP) foi cuidadora nos Estados Unidos antes de sofrer o acidente de carro que a deixaria imobilizada do pescoço para baixo. Na audiência, Mara enalteceu o trabalho das profissionais que cuidam dela.

— Sempre que algo fica muito difícil eu penso ‘imagina se eu não tivesse essas cuidadoras?’. A vida seria quase que impossível, como acontece com as pessoas que não têm. E, como assim, no Brasil, ainda não tem uma política de cuidado? Isso vai fazer com que muitas pessoas comecem a exercer cidadania, isso vai ficar mais barato para o país mais tarde, porque você está dando independência, está trazendo contribuintes — argumentou a senadora.

Política de cuidado
Convidados para o debate, três representantes do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos concordaram com a necessidade de iniciativa do poder público no atendimento a esses cuidadores. José Naum, da Coordenação-Geral das Pessoas com Doenças Raras, destacou a importância de equipamentos ativos e acessíveis aos pacientes em todo o território nacional, que permitam ao cuidador algum tempo para si mesmo.

— Nós devemos identificar o que já existe e ver formas de aperfeiçoar, para não ficar sempre recriando a roda. Mas, como de fato assumir um compromisso para que esses serviços sejam eficientes? Para que as famílias que têm cuidadores em tempo integral possam usufruir desses espaços e poderem também cuidar de si — disse.

Para o secretário nacional de Promoção e Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa do mesmo ministério, Antônio Costa, o país precisa se preparar para cuidar de uma população cada vez mais envelhecida.

— Essa Casa tem uma oportunidade grande, junto com o governo federal, de começar a tratar, a partir dessa pesquisa que foi feita, e a partir das nossas políticas que estão sendo tratadas, um novo momento para que possamos realmente, de forma efetiva, produzir para esse país uma política de cuidados — ressaltou.

Encontrar esse caminho em conjunto entre Estado e sociedade civil foi o desafio apontado pelo coordenador-geral de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência, Volmir Raimondi.

— Poder encontrar o caminho de instituir uma política de cuidado e um reconhecimento dos cuidadores de forma que ela seja exequível, que ela possa ser implantada e permanecer, não podemos mais criar programas ou projetos que depois se extinguem por si só, porque não existem recursos para essa função, porque não existem medidas adequadas e que acabam interferindo na efetividade da política pública — argumentou.

Parceria e articulação defendidas pelo senador Flávio Arns, que defendeu a possibilidade de o Benefício de Prestação Continuada (BPC) — renda de um salário —mínimo para idosos e deficientes que não podem se manter ou ser mantidos por suas famílias — também seja extensivo ao cuidador doméstico.

— Para o caso de a pessoa não trabalhar, até para ela própria sustentar a casa e tudo. Quer dizer, é um BCP ou são dois BCPs? A gente tem que achar essas soluções — disse.

Crítica
Já o senador Fabiano Contarato (Rede-ES) criticou o governo federal em razão do projeto de lei (PL) 6.159/2019. A proposta altera as políticas de habilitação e reabilitação profissional e as medidas de inclusão de pessoas com deficiência no mercado de trabalho.

O projeto está acabando com o sistema de cotas de pessoas com deficiência, que foi uma conquista que a população teve. Que só quem tem uma pessoa com deficiência, com doença rara ou idoso em casa sabe o que é. É preciso ter um olhar muito mais humanizado. O governo está violando um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, que é promover a dignidade da pessoa humana — lamentou.

Foto: Waldemir Barreto/Agência Senado

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)

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